Por Luiz Alberto Machado*
Considerando que o primeiro relatório do boletim Focus do Banco Central, divulgado em 5 de janeiro de 2024, estimava um crescimento do PIB de 1,59%, e que o mais recente, divulgado em 16 de dezembro, prevê um crescimento de 3,42% − mais do que o dobro, portanto −, seria de se esperar que a maior parte das matérias que habitualmente surgem nesta época do ano, fazendo o retrospecto do que aconteceu e, eventualmente, um prognóstico do que poderá ocorrer no ano seguinte, comemoraria o resultado obtido pelo País.
No entanto, não é isso que se observa, uma vez que, mesmo as matérias que dão destaque ao crescimento obtido, fazem questão de chamar atenção para a difícil sustentabilidade desse crescimento, em razão de uma série de problemas que envolvem a atual conjuntura macroeconômica.
Muitas das dúvidas e questionamentos têm origem na elevação dos gastos públicos que insistem em permanecer muito acima do desejável, apesar dos esforços − mais retóricos do que efetivos − do presidente da República e da equipe econômica liderada pelo ministro Fernando Haddad.
A recente tentativa de contornar o problema por meio da PEC 45/2024, conhecida como PEC do Corte de Gastos, afinal aprovada com modificações no dia 19 de dezembro, ficou longe de atingir os objetivos a que se propunha.
Ao contrário, o anúncio do pacote de corte de gastos no final de novembro provocou fortes reações negativas do mercado e de setores consideráveis do empresariado. Em consequência disso, o dólar disparou, ultrapassando o patamar dos R$ 6,00 pela primeira vez na história, e o Conselho de Política Monetária (Copom), em sua reunião concluída dia 11 de dezembro, aumentou em um ponto percentual a taxa básica de juros, levando a Selic para 12,25%. A ata da reunião, divulgada dia 17 de dezembro, afirmou que mais dois aumentos da mesma magnitude poderiam ocorrer nas próximas reuniões.
De acordo com a referida ata, a reação do mercado financeiro ao pacote fiscal do governo federal tornou o cenário inflacionário mais adverso, demandando uma política mais contracionista. De fato, na contramão do que se viu com o crescimento do PIB, o relatório do boletim Focus de 5 de janeiro de 2024 previa uma inflação de 3,90%, enquanto que o relatório divulgado no dia 16 de dezembro prevê uma inflação de 4,89%.
Diante dos recentes acontecimentos, em vez de comemoração do crescimento superior ao esperado em 2024 e do baixo nível de desemprego, a maioria das matérias apresenta um viés negativo, resultante da combinação da inflação acima da meta, déficit público crônico, dívida pública crescente e desvalorização do real.
Com isso, somos obrigados a conviver com uma situação que foi recorrente por muitos anos no Brasil. Sem uma política fiscal eficiente, que consiga solucionar satisfatoriamente a questão fiscal, e sendo incapaz de controlar o câmbio por meio da política cambial, resta como única alternativa ao governo lançar mão da política monetária, elevando a taxa de juros. Como se sabe, no médio prazo, tal medida encarece o crédito e tende a reduzir o consumo e o investimento, comprometendo o próprio crescimento econômico.
Já vimos filmes com esse roteiro diversas vezes. E o desfecho não foi nada feliz.
* Luiz Alberto Machado é graduado em Ciências Econômicas pela Universidade Mackenzie (1977), mestre em Criatividade e Inovação pela Universidade Fernando Pessoa (Portugal, 2012). É sócio-diretor da empresa SAM – Souza Aranha Machado Consultoria e Produções Artísticas, consultor da Fundação Espaço Democrático e membro do Instituto Fernand Braudel.