Por Roberto Macedo*
Ilan Goldfajn, brasileiro que recentemente assumiu a presidência do BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento) e também já foi presidente do Banco Central do Brasil, deu uma entrevista ao jornal britânico Financial Times, reproduzida pela Folha de S. Paulo no dia 5 de outubro último.
Obviamente, em face de sua posição, ele não pode colocar o Brasil em destaque em suas manifestações, mas nosso País é o mais importante da América Latina e muito do que disse se refere a ele, ainda que indiretamente.
Ele concentrou sua análise em três oportunidades abertas aos países da região, em face de seus recursos naturais: energia verde, alimentos e minerais críticos, mas não deixou de se referir a outros aspectos ao dizer “… além de responder às demandas das populações para melhorar saúde, educação e infraestrutura digital”. E ressaltou: “Isso não é apenas uma narrativa, na verdade há uma oportunidade a ser aproveitada… participaremos de tudo o que pudermos fazer em termos de energias renováveis, minerais limpos e coisas assim”.
Alguns aspectos dessas oportunidades: a América Latina tem dois terços das reservas mundiais de lítio, cuja demanda está crescendo rapidamente, pois é usado nas baterias de carros elétricos. A produção deles vem aumentando muito. Soube que, no Brasil, uma das maiores reservas de lítio está localizada no Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais, região muito pobre, e essa produção do mineral deverá ajudá-la. Goldfajn disse também que a região tem 38% das reservas de cobre, que são muito concentradas no Chile. Tanto o lítio como o cobre são necessários para a transição para os veículos elétricos e energia renovável.
Sobre os alimentos, é sabido que o Brasil é um dos maiores exportadores de produtos agrícolas e vem tomando proveito disso. O crescimento de 3% do PIB previsto para este ano tem pelo menos um terço de contribuição do setor agropecuário, sendo que as safras agrícolas tiveram um crescimento excepcional neste ano.
Ele também ressaltou que a região precisa aproveitar o seu poder solar e eólico “abundante e barato”, além de produzir e exportar hidrogênio verde – que tem perspectivas de maior demanda internacional em face das preocupações de muitos países em utilizar energias limpas e renováveis.
O leitor deve estar percebendo que os três aspectos ressaltados por Goldfajn vêm recebendo uma atenção crescente no Brasil. Mas, como ele disse, não se pode ficar só na conversa: “Você precisa se organizar, planejar, trazer os recursos, ter o estado de direito e regulação”.
Quanto a recursos, ele anunciou que o BID planeja aumentar seus empréstimos aos países da região em US$ 20 bilhões, cerca de R$ 100 bilhões na próxima década, particularmente para aproveitar a transição para a energia limpa e a aproximação da produção do mercado dos EUA, ou seja, ampliar a exportação do que for produzido.
* Roberto Macedo é economista (UFMG, USP e Harvard), professor sênior da USP e membro do Instituto Fernand Braudel.
Artigo publicado no site da Fundação Espaço Democrático em 24 de outubro de 2023.