Presidente enfrenta situação muito difícil na economia e vem tropeçando em várias questões que abalara, seu prestígio
Por Roberto Macedo*
O IBC-Br, índice mensal do Banco Central, que procura antecipar a variação do Produto Interno Bruto (PIB) oficial – o calculado pelo IBGE e divulgado trimestralmente –, mostrou em janeiro, relativamente a dezembro de 2022, a taxa de -0,04%, indicando que a má situação da economia permanece após a tendência de queda dos índices trimestrais do PIB do IBGE. No ano passado, suas taxas foram de 1,3%, 0,9%, 0,3% e -0,2%, do primeiro ao quarto trimestres, respectivamente. Do IBGE veio também um dado nada bom, pois seu setor de serviços, o mais importante do PIB, teve queda de 3,1% em janeiro.
Outro índice, o Monitor do PIB, do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas, um índice que tem o mesmo objetivo do IBC-Br, também mostrou ontem um resultado ruim, nada crescendo em janeiro de 2023.
Os dois índices coincidiram na sua avaliação do crescimento do PIB em 2022, que foi de +2,9%, taxa igual à do IBGE. Quando saiu esse resultado, no início do mês passado, Lula estranhamente tropeçou e disse que a economia não havia crescido nada no ano anterior. Também tropeçou ao ignorar a tendência de queda das taxas trimestrais mostrada anteriormente – deixando, assim, de lado uma grande oportunidade de criticar Jair Bolsonaro pela péssima situação em que deixou a economia ao sair do governo. Portanto, Lula herdou uma economia em situação muito difícil para a retomada de um crescimento econômico a taxas bem maiores, com o mercado financeiro prevendo, por meio do mais recente Boletim Focus (semanal) do Banco Central, que o PIB irá crescer apenas 0,9% em 2023.
Além de errar na taxa anual do PIB de 2022 e perder essa oportunidade de criticar Bolsonaro, Lula passou a tropeçar noutras questões que abalaram o seu prestígio, inclusive algumas impostas por auxiliares. Uma delas, muito importante, foi que na viagem à China deu declarações absurdas dizendo que a Ucrânia também foi responsável pelo início da guerra contra a Rússia, embora tenha sido esta que inicialmente atacou a Ucrânia. Serguei Lavrov, ministro das Relações Exteriores da Rússia e homem forte no governo russo, veio até aqui na semana passada para agradecer esse tropeço de Lula em favor de Putin.
Noutro tropeço, Lula levou João Pedro Stédile, conhecido líder do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), na sua viagem à China – para fazer o quê? Um passeio? –, revelando sua grande amizade por ele. Mas, no retorno ao Brasil, o MST presenteou Lula com invasões de fazendas produtivas, sedes estaduais do Incra e até uma área da Embrapa Semiárido no estado de Pernambuco.
Houve também o caso do deputado federal Juscelino Filho (União Brasil-MA), ministro das Comunicações de Lula e objeto de reportagens que mostraram utilização de recursos públicos em seu benefício e de familiares, inclusive de forma insólita, como ao tomar a iniciativa de uma viagem a serviço a São Paulo que ele utilizou para comparecer a um leilão de cavalos de raça. A última notícia ruim foi a de que um funcionário contratado pelo seu gabinete não trabalhava em Brasília, mas na fazenda de um parente do ministro. Acho que este Juscelino não honrou seu nome – provavelmente inspirado no do ex-presidente Juscelino Kubitschek – e já deveria ter sido demitido do ministério que ocupa.
Noutro tropeço amigável, o presidente que Lula nomeou para a Apex, uma agência governamental de promoção de exportações, o ex-senador Jorge Viana (PT-AC), logo aboliu o requisito de domínio do inglês para o exercício do cargo e, segundo este jornal, empregou como assessores um mochileiro, um cantor e um arquiteto para cuidar da promoção dos produtos brasileiros no exterior. Nenhum desses assessores tem experiência na área de comércio internacional.
Passando a um tropeço vindo da esfera familiar, houve uma compra de móveis para uso na residência do presidente e sua esposa, no Palácio da Alvorada, incluindo um sofá no valor de R$ 65 mil (!) e uma cama no valor de R$ 42,2 mil (!). Parece que a compra foi cancelada sob o pretexto de que a empresa vendedora não entregou os demais itens, mas ficou o dano à imagem do presidente e de sua mulher.
Se Lula está pensando em se candidatar à reeleição, esses vários tropeços provavelmente serão explorados por seus adversários no debate político atual e na campanha. Minha percepção é de que, talvez pela idade já avançada, ele esteja perdendo o controle do que fala e do que deixa seus funcionários fazerem. Há quem diga que nesta idade as pessoas costumam se lembrar mais de coisas bem antigas, com o que ele parece tocar a Presidência da República, sem o que se espera do condutor desse cargo. Uma saída seria evitar falas de improviso e recorrer a textos elaborados com sua orientação, mas revisados por auxiliares preparados para evitar tropeços. E que ele passasse a cuidar melhor do Brasil, em lugar de se empenhar tanto no seu projeto de tornar-se um líder mundial. Não tem estofo para tanto. E está viajando muito ao exterior.
* Roberto Macedo é economista (UFMG, USP e Harvard), professor sênior da USP e membro do Instituto Fernand Braudel.
Artigo publicado no jornal O Estado de S. Paulo em 20 de abril de 2023.