Para o economista Roberto Macedo, chineses têm pouco a oferecer no processo de reindustrialização do Brasil
Por Roberto Macedo*
O presidente Lula viajou à China levando enorme comitiva de executivos governamentais, políticos e empresários, com o objetivo de expandir o relacionamento entre os dois países em áreas que vão de questões ambientais a investimentos chineses em infraestrutura no Brasil.
Há quem diga que o processo de desindustrialização em curso no Brasil será um tema também abordado nas negociações, mas vejo muitas dificuldades para a China ajudar num esforço brasileiro de reindustrialização. Uma análise do banco BNP Paribas, divulgada via internet no dia 5 deste mês, ajuda a entender a natureza do relacionamento comercial Brasil-China.
Essa análise enfatiza o enorme crescimento desse comércio nos últimos 20 anos. Em 2022 o comércio bilateral entre os dois países alcançou a enorme cifra de US$ 150 bilhões, cerca de 37 vezes (!) o seu valor de 2001. Desde 2009, a China passou a ser o maior parceiro comercial do Brasil, absorvendo 27% de nossas exportações, porcentagem essa que era de apenas 3% em 2001. A China é também a nossa maior provedora de importações, respondendo em 2022 por 22,3% delas, com os Estados Unidos ficando em segundo lugar com 18%.
A estrutura desse comércio com a China é que traz dificuldades para uma eventual colaboração daquele país num esforço brasileiro de reindustrialização. 96% das importações chinesas do Brasil são de commodities ou de produtos baseados nelas, como soja, minério de ferro, polpa de madeira, carne e açúcar, conforme dados de 2021. Do lado das exportações chinesas para o Brasil, predominam produtos manufaturados, de nível tecnológico médio e alto.
Na minha visão, o crescimento das exportações desses produtos chineses para o Brasil pesou no nosso processo de desindustrialização, dado o avanço tecnológico chinês e o fato de que seus produtos são muito competitivos em termos de preços. Aliás, um aspecto específico dessas importações é que parte delas são feitas diretamente via Correios pelos próprios consumidores, sem um adequado pagamento de tributos – e tanto assim é que o governo federal e os Estados estão atualmente trabalhando para corrigir essa distorção.
Nesse contexto, é difícil imaginar que o Brasil poderia ampliar sua exportação de manufaturados para a China, pois não teríamos muito a oferecer. Uma ideia seria ela nos ajudar suprindo, ainda que a custo, tecnologia para produção de produtos manufaturados no Brasil, que por sua vez procuraria usá-los não apenas para o mercado interno mas para exportações em geral.
Dado esse quadro, o que vejo com maior perspectiva de sucesso seria a ampliação dos investimentos chineses no Brasil na área de infraestrutura, cujas carências levam a custos que oneram os produtos brasileiros, constituindo também um fator por trás da desindustrialização, pois esses custos tornam nossos produtos menos competitivos.
Observarei os resultados conseguidos pela visita de Lula e seus acompanhantes à China e se houver novidades interessantes voltarei ao assunto tratado neste artigo.
* Roberto Macedo é economista (UFMG, USP e Harvard), professor sênior da USP e membro do Instituto Fernand Braudel.
Artigo publicado no site da Fundação Espaço Democrático em 17 de abril de 2023.