Congresso tem sido o maior protagonista da agenda de reformas
Histórico recente revela que o Parlamento é tão ou mais importante que o Ministério da Economia como agente formulador de reformas na legislação econômica.
Por Rogério Schmitt*
Estamos entrando no último ano do governo Bolsonaro e também no último ano da atual legislatura do Congresso. Resolvi então aproveitar este período de recesso parlamentar – e também de (pelo menos até outro dia) férias presidenciais – para fazer um levantamento das reformas econômicas mais importantes aprovadas nos três primeiros anos do corrente ciclo de governo.
Vou deixar de lado a agenda de reformas macroeconômicas, também conhecidas como reformas estruturantes (pois elas quase sempre envolvem mudanças no texto da Constituição Federal). A única reforma macro aprovada nesse período foi a da Previdência (Emenda Constitucional 103, promulgada em novembro de 2019). E os outros itens principais da agenda de reformas estruturantes (a tributária e a administrativa) dificilmente serão aprovados em um ano eleitoral.
Mas, ao contrário do que uma análise política mais descuidada poderia sugerir, esses últimos anos estiveram longe de ser uma fase de paralisia na agenda de reformas. Ao contrário: as reformas microeconômicas estão vivendo um período extremamente favorável. O levantamento apresentado a seguir (que talvez ainda esteja incompleto) conseguiu identificar um total de 17 importantes propostas de reformas micro já aprovadas entre 2019 e 2021.
As reformas microeconômicas correspondem ou a projetos de regulação de mercados e setores específicos da economia, ou a projetos que visam melhorar o ambiente de negócios como um todo. A segunda característica importante destas propostas é o fato de serem mudanças legais de natureza infraconstitucional. Por fim, a agenda de reformas micro também se define por sua orientação pró-mercado, com o objetivo de criar incentivos para maiores investimentos privados.
O quadro abaixo enumera as 17 reformas econômicas aprovadas pelo Congresso Nacional e sancionadas pela Presidência da República nos três primeiros anos do atual ciclo de governo. O ritmo de aprovação das reformas não foi homogêneo: mais lento nos dois primeiros anos (3 reformas aprovadas em 2019 e 2 em 2020), e bem mais intenso na segunda metade do período (nada menos que 11 reformas foram sancionadas em 2021, e uma já em janeiro de 2022).
Cada item dessa lista teve uma história e poderia virar um artigo próprio. Mas aqui apresento somente um panorama geral. Além disso, o impacto econômico efetivo dessas reformas não se esgota no curto prazo e, portanto, nem poderia ser avaliado aqui.
Achei, porém, interessante registrar a origem institucional de cada reforma microeconômica aprovada, ou, em outras palavras, se a respectiva lei foi originalmente proposta pelo Poder Executivo, pela Câmara ou pelo Senado. No entanto, a aprovação de reformas microeconômicas tipicamente pressupõe alguma cooperação entre as maiorias legislativas e o Palácio do Planalto. Vale, por fim, registrar que diversos projetos dessa lista começaram a sua tramitação legislativa em períodos de governo anteriores (a Lei de Falências, por exemplo, desde 2005).
Seja como for, outra descoberta contraintuitiva revelada pelo quadro é que praticamente dois terços (64,7%) das reformas econômicas aprovadas no período surgiram de projetos de lei originalmente apresentados por senadores (41,2%) ou por deputados (23,5%). Dito de outro modo: é o Congresso Nacional – e não o governo ou o Ministério da Economia – que vem sendo o principal formulador da agenda de reformas microeconômicas no País. E ainda vale ressalvar que das seis reformas que se originaram do Poder Executivo, metade tramitou como medida provisória.
E que outras reformas microeconômicas já aparecem no meu radar para o ano que está em curso? É só conferir este outro quadro, que enumera meia dúzia de reformas (sem contar as que porventura ainda possam ser apresentadas no futuro) com algum potencial para aprovação ao longo de 2022.
Naturalmente, nem todos os novos projetos da agenda de reformas micro serão necessariamente aprovados neste ano. Mas a maioria deles está relativamente próxima disso, seja porque já foram aprovados em uma das casas do Congresso, ou porque estão em regime especial de tramitação (medida provisória ou pedido de urgência). No cenário mais otimista, talvez somente a aprovação do novo marco legal do petróleo acabe ficando para o próximo período de governo.
Resumo da ópera: 1) o quadriênio que estamos prestes a completar será certamente mais lembrado pelos avanços na agenda de reformas micro do que na agenda de reformas macro; e 2) o Congresso é tão ou mais importante que o Ministério da Economia como agente formulador de reformas na legislação econômica.
* Rogerio Schmitt é cientista político e colaborador do Espaço Democrático.
Artigo publicado no site da Fundação Espaço Democrático em 24 de janeiro de 2022.