O Código de Processo Civil (CPC) vigente estabelece que a sentença condenará a parte vencida a pagar as despesas processuais e os honorários advocatícios da parte vencedora. Como todo agente econômico, o potencial litigante pesará os custos e benefícios de recorrer ao Poder Judiciário e decidirá agir de forma a maximizar seu retorno. Assim, ele avaliará o valor da causa, a probabilidade de vencer e sua despesa caso não logre sucesso na ação.
Em se tratando de honorários advocatícios, estes podem ser fixados pelo magistrado entre o mínimo de 10% e o máximo de 20% sobre o valor da condenação, considerando o grau de zelo do profissional, o lugar de prestação do serviço, a natureza e importância da causa, o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido, conforme o parágrafo 3º do art. 20 do CPC. Esse custo não é desprezível e certamente influencia a decisão de alguém que esteja pensando em entrar com uma ação judicial.
Era de se esperar que a mesma avaliação acontecesse no momento de interpor um recurso; no entanto, o CPC vigente não traz a previsão de novos honorários advocatícios quando se recorre. Isso significa que o perdedor, na primeira instância, tem todo o incentivo a recorrer, uma vez que não correrá nenhum risco em fazê-lo. Além de não correr risco financeiro, ele se beneficiará por retardar o pagamento do principal, especialmente porque os juros impostos pela Justiça são inferiores aos praticados pelo mercado. Há um estímulo econômico para o devedor não aceitar a sentença, mesmo quando ele reconhece que a decisão foi justa e correta. Essa ausência de custo extra para manter o processo tramitando é um dos motivos para a morosidade do Poder Judiciário. Se houvesse receio de incorrer em nova despesa antes de protocolar um recurso, o litigante talvez decidisse por não recorrer.
Em 2007, os economistas norte-americanos Leonid Hurwicz, Eric Maskin e Roger Myerson venceram o Prêmio Nobel de Economia por estabelecerem as bases da Teoria de Desenho de Mecanismos que, em linhas gerais, busca entender os incentivos com os quais se defronta um agente no momento de tomar uma decisão que afeta outros agentes e, entendendo esses incentivos, criar regras de alocação de recursos que levem todos os agentes a agirem de forma ótima, de acordo com um critério previamente estabelecido.
Um exemplo conhecido que ilustra a Teoria de Desenho de Mecanismos é como dividir uma barra de chocolate entre duas crianças. Cada uma quer a maior parcela possível do doce e temos de evitar que as crianças se desentendam, além de induzir uma divisão igualitária do chocolate. Um possível mecanismo para se atingir esse objetivo é o seguinte: uma das crianças parte o chocolate em dois pedaços, e a outra, em seguida, escolhe que pedaço ela quer. Dessa forma, a primeira criança será incentivada a dividir o chocolate exatamente na metade, pois, caso contrário, ficará necessariamente com o menor pedaço.
Admitindo o fato de que as pessoas respondem a incentivos, ou seja, tomam suas decisões de forma estratégica, é fácil perceber que o mecanismo criado pelo atual CPC gera incentivos para que sejam usadas todas as possibilidades processuais para retardar o final do trâmite judicial. Há um consenso de que essa infinidade de recursos protelatórios diminui a efetividade do Poder Judiciário, assoberbando-o, e prejudica a prestação jurisdicional.
Nesse sentido, o projeto do novo CPC, em tramitação no Congresso Nacional, deu um passo importante para resolver a questão. Ao contrário da situação atual, em que as despesas processuais são fixadas na primeira instância e não são mais alteradas à medida que o processo é levado às instâncias superiores, o projeto prevê que os honorários advocatícios aumentem a cada recurso interposto. Mais precisamente, o parágrafo 6º do art. 73 do projeto dispõe que, “quando o acórdão proferido pelo tribunal não admitir ou negar, por unanimidade, provimento a recurso interposto contra sentença ou acórdão, a instância recursal, de ofício ou a requerimento da parte, fixará nova verba honorária advocatícia”, até o limite total de 25% do valor da condenação.
Da Teoria de Desenho de Mecanismos, extrai-se o conceito de “racionalidade individual”, segundo o qual um agente somente aceitará participar de um mecanismo se calcular que receberá uma utilidade esperada maior ou igual à utilidade que receberá se dele não participar. Como o custo de recorrer ficou maior, considerando as novas regras do sistema recursal proposto no projeto, a utilidade esperada dessa ação diminuiu.
As causas deveriam, em princípio, extinguir-se no primeiro grau, com o imediato e espontâneo cumprimento da sentença. Embora os recursos sejam importantes para o aperfeiçoamento das decisões judiciais, o estímulo para que sempre e em quaisquer circunstâncias haja sua interposição é uma deformação do nosso sistema. Pode-se dizer que as novas regras propostas criam um mecanismo que aumenta fortemente a probabilidade de o litigante somente recorrer se realmente acreditar que obterá sucesso. Dessa forma, o custo extra para perpetuar a ação certamente desestimulará a litigância de má-fé e as aventuras judiciais. Caso o projeto seja aprovado no Congresso Nacional, o sistema recursal brasileiro terá recebido aprimoramento importante no sentido de viabilizar os incentivos corretos para aumentar o bem-estar social.